segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Flogose XXIX

Blaise Pascal disse: "Se o homem fosse feliz, sê-lo-ia tanto mais quanto menos divertido, como os Santos e Deus. - Sim; mas não sendo feliz pode animar-se pelo divertimento? - Não; porque vem doutro sítio e de fora; e assim é dependente e, portanto, sujeito a ser perturbado por mil acidentes que tornam as aflições inevitáveis. (...) A única coisa que nos consola das nossas misérias é o divertimento, e contudo é a maior das nossas misérias. Porque é isto que nos impede principalmente de pensar em nós, e que nos faz perder insensivelmente. Sem isso, estaríamos no tédio, e este tédio levava-nos a procurar um meio mais sólido de sair dele. Mas o divertimento distrai-nos e faz-nos chegar insensivelmente à morte." Isidore de Lautréamont disse: Os homens, tendo podido curar-se da morte, da miséria, da ignorância, lembraram-se, para se tornarem felizes, de não pensar nisso. Foi tudo quanto inventaram para se consolarem de tão poucos males. Consolação riquíssima. Não se dirige a curar o mal. Esconde-o por um pouco. Escondendo-o, faz com que se pense em curá-lo. Por uma legítima desordem da natureza do homem, não se acha que o tédio, que é o seu mal mais sensível, seja o seu maior bem. Pode contribuir mais do que qualquer outra coisa para lhe fazer procurar a sua cura. Eis tudo. O divertimento, que ele olha como o seu maior bem, é o seu ínfimo mal. Aproxima-o, mais do que todas as outras coisas, de procurar o remédio para os seus males. Um e outro são contraprova da miséria, da corrupção do homem, excepto da sua grandeza. O homem aborrece-se, procura aquela multidão de ocupações. Tem a ideia da felicidade que conquistou; felicidade que, encontrando em si, procura nas coisas exteriores. Contenta-se. Será o divertimento um mal tão nefasto assim? E será que o divertimento, embora nefasto, seja necessário para que os homens vivam? O divertimento, de certo modo, parece mesmo um mal que abranda males "maiores". Hoje, todavia, há uma gama de coisas que criam liame entre vícios e diversão e isso é o que torna o divertimento algo, não só por ser paliativo, interessante. Pois o divertimento vende. Divertimento é hoje um produto que abastece todas as regiões do mundo. O homem sempre arruma um meio de extravasar suas dores, mas será que é o divertimento um meio hábil de se conseguir extirpar dores da alma? Certamente não hei concordar com tal afirmativa, embora na atualidade o divertimento tenha essa propaganda. O divertimento continuará sendo, talvez, a nossa maior miséria, pois é nele que todas as outras misérias encontram guarida.

Nenhum comentário:

Postar um comentário