A campainha soa.
Ela ainda fuma seu cigarro na sacada, desta vez de toalha. Perdeu a hora
observando um casal que brincava com jogos de sedução num canto qualquer da
rua. A campainha soa novamente, e ela se prepara rapidamente para atender a
porta.
Ao abrir a porta
ela percebeu que se tratava de um homem branco entre 45 e 50 anos. Notou um ser
vistoso, embora o tempo tivesse desgastado parte dessa beleza. Viam-se no rosto
olhos de cor forte e sedutora. Os lábios rosados eram circundados por uma barba
mal feita, mas que demonstravam certo cuidado. Trajada uma calça jeans, uma
camisa pólo e sapato sujos pela poeira alaranjada das estradas de terra do interior
da cidade. Ao ver aquele homem ela, de uma maneira sutil, sentiu algo estranho.
Uma conexão. Algo que só sentira poucas vezes, normalmente quando estava
desesperada por afeto. Não era o caso.
- Olá. Foi o que o
homem disse, no mesmo instante em que ela acenou para que ele entrasse. Ela o
notou lamber os lábios, enquanto a olhava de cima a baixo. Ela o pegou pela mão
e foi com ele para a cama, mas sentia-se – estranhamente – receosa. Agiu
moderadamente, ao contrário do que fazia de costume. Gostava de agir rápido
para não perder o entusiasmo. Com esse homem, porém, ela não entendeu por que
não estava conseguindo agir.
Ele se deitou na
cama, e ela delicadamente começou a tirar-lhe o calçado. Uma lembrança de sua
infância invadiu sua alma. Fizera isso no passado, mas não deu atenção.
Continuou com o trabalho, e tentou agir – de forma quase desengonçada –
sensualmente. Deitou-se sobre o homem, e beijou-lhe os róseos lábios. Novamente
a sensação de proximidade invadiu seu corpo. Ela continuou, e ele, absorvido
pelo ímpeto de prazer, segurou-a pelos cabelos e, aparentemente, tentava sugar
dos lábios dela o prazer que ela vendia.
Eles rolavam pela
cama. As mãos invadiam cada vez mais as lacunas do prazer. Ele se irrompia em
gemidos, e ela tentava absorver algo do prazer que visivelmente proporcionava
ao homem. Ele beijava-lha o corpo, e ela caminhava entre sensações que não
podia explicar ou jamais havia sentido enquanto profissional.
O perfume que o
homem usava lembrava-lhe alguém de quem ela não tinha lembranças. Ela conhecia
o cheiro, mas não sabia de quem era. Ou, talvez, as lembranças estavam perdidas
em algum lugar da sua consciência.
Ela fechava os
olhos e um turbilhão de sensações e pensamentos invadiam sua mente. Ela não se
permitia entender o que estava acontecendo, sequer. O homem continuava em sua
busca sagaz pelo prazer. Deixou-a apenas de calcinha, e alimentava-se – tal
qual uma criança – de um prazer líquido concebido através dos delicados seios
dela. Ela abriu os olhos e o notou fazer expressões de completa introspecção,
enquanto devorava algo que podia – muito bem para ele – ser comparado a um
manjar dos deuses.
A cada novo segundo
que passava, ela sentia sua conexão com o homem aumentar. Não era prazer, ou
talvez não apenas isso.
Ele retirou a calcinha
dela, e delicadamente começou a beijar-lhe os pés. Sentiu ela um formigamento,
mas nada disse. Ele continuou. Beijou-a delicadamente até atingir-lha o sexo.
Ela concentrava-se, mas sentia algo entre prazer, euforia e desconforto.
Estranhamente começou
ela a ter pensamentos de seu pai. Lembranças de quando era ainda uma menina de
apenas 04 anos, e foi abandonada juntamente com sua mãe para viver no extremo
da miséria, sem, sequer, um lugar para morar. Lembrou-se que ele não era um pai
atencioso, e que ele constantemente sumia por dias.
Abriu os olhos e
tentou se concentrar em seu trabalho. Puxou a cabeça do homem e beijou-lhe os
lábios ansiedade. Os pensamentos voltaram novamente. Em sua mente viam
lembranças de que não sabia muito do seu pai, e tudo o que sabia sua mãe que
lhe havia dito. Normalmente coisas terríveis, coisas que os ímpares dizem um do
outro.
Tentou se
concentrar novamente. Queria encerrar logo aquele turno. Não sabia quanto tempo
havia passado, e tinha outros compromissos depois daquele. O homem continuava
efusivo. Não fazia questão de dominar o prazer que sentia, ao contrário queria
compartilhá-lo com a dama. Fazia questão de colocá-la em sua sintonia.
Pensamentos
invadiam sua mente novamente. Dessa vez ela tentou lembrar por que sentia
rancor por seu pai. Não se tratava apenas no abandono ou das coisas que sua mãe
lhe havia dito, mas de que sua vida só era aquela por que ele a tornara assim.
Ele rejeitou sua família, ela a rejeitou.
Começou a sentir-se
deprimida com os pensamentos, e quanto mais tentava se afastar deles mais eles
pareciam chover em sua mente. Tentou apenas não notá-los, a fim de que pudesse
finalizar o trabalho.
Ela, neste momento,
já empunhava o sexo dele em uma das mãos, e com extrema perícia o fazia tremer
de prazer. Ele continuava de olhos fechados, ou talvez tivesse abdicado da
visão para aumentar as sensações que pareciam aumentar em proporções
geométricas.
Preparou-se ela
para o ato final. Delicadamente retirou cada peça de roupa dele. Beijou-o os
lábios, e começou a tecer as notas de sua grande e partitura. Cada toque era
agora pensado. Os beijos delicados o faziam tremer ainda mais. Ela usava a
euforia dele para estimulá-lo ainda mais. Ao chegar ao umbigo parou e deixou
que seus seios tocassem o sexo dele. Algo delicado, e talvez algoz. Os
estímulos que aquela posição causava eram percebidos pelo comportamento do
homem que gemia, tremia e mais pedia.
Ela fechou os
olhos, e sibilou a primeira nota do trecho final do ato. Eram arpejos. Notas
subindo e descendo. Ela traduzia sua opera naquele ato carnal. Mantinha os
olhos fechados para concentrar-se ao máximo. Ao sentir que o ato acabaria
resolveu diminuir o tempo e abriu os olhos e afastou-se devagar. Nesse momento
notou uma tatuagem, uma pequena tatuagem em grego, que a fez sentir paralisar.
Uma estranha sensação de frio percorreu todo o seu corpo. Ela sentiu vertigem e
laçou-se para a lateral da cama no mesmo instante em que começou vomitar.
Ela sentou-se no
chão do quarto, e abraçou as próprias pernas. Pensava que aquilo não podia ser
verdade. O homem sem entender o que acontecia sentou-se à beira da cama.
Perguntou a ela como se sentia. Ela nada respondeu.
Tentava ela
reorganizar sua mente. Compreender o que estava acontecendo. Talvez fosse uma
coincidência, uma triste coincidência. Ela se levantou foi até o banheiro e de
lá perguntou como era o nome do homem. Ele prontamente respondeu: - Agabo.
Silenciosamente
começou a chorar. O ódio invadiu seu corpo e sua alma. Preparando-se para sair
do banheiro ela disse: - Sabe como me chamo? - Não. - Abadir dos Reis. O homem
nada disse.
Ao sair do banheiro
ela disse: - Sentiu minha falta, papai? E desferiu seis tirou no peito do
homem, que morreu instantaneamente.
Ela voltou ao
banheiro, tomou um longo banho. De lá saiu já com a toalha e foi diretamente
para a varanda fumar um cigarro. Voltou para o quarto escolheu uma bela roupa.
Acendeu outro cigarro, rezou uma ave-maria, jurou que não seria mais puta.
Sumiu no mundo não mais se sentindo aquela menina rejeitada, mas antes disso
deu uma tragada no cigarro e jogou-o sobre a cama.
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