terça-feira, 23 de setembro de 2008

Flogose LVII

Essa é, com toda certeza, uma das melhores estórias que já li na minha vida. A verdade - Luís Fernando Verissímo. Uma donzela estava um dia sentada à beira de um riacho, deixando a água do riacho passar por entre os seus dedos muito brancos, quando sentiu o seu anel de diamante ser levado pelas águas. Temendo o castigo do pai, a donzela contou em casa que fora assaltada por um homem no bosque e que ele arrancara o anel de diamante do seu dedo e a deixara desfalecida sobre um canteiro de margaridas. O pai e os irmãos da donzela foram atrás do assaltante e encontraram um homem dormindo no bosque, e o mataram, mas não encontraram o anel de diamante. E a donzela disse: - Agora me lembro, não era um homem, mas dois. E o pai e os irmãos da donzela saíram atrás do segundo homem, e o encontraram, e o mataram, mas ele também não tinha o anel. E a donzela disse: - Então está com o terceiro! Pois se lembrara que havia um terceiro assaltante. E o pai e os irmãos da donzela saíram no encalço do terceiro assaltante, e o encontraram no bosque. Mas não o mataram, pois estavam fartos de sangue. E trouxeram o homem para a aldeia, e o revistaram, e encontraram no seu bolso o anel de diamante da donzela, para espanto dela. - Foi ele que assaltou a donzela, e arrancou o anel de seu dedo e a deixou desfalecida – gritaram os aldeões. – Matem-no! - Esperem! – gritou o homem, no momento em que passavam a corda da forca pelo seu pescoço. – Eu não roubei o anel. Foi ela que me deu! E apontou a donzela, diante do escândalo de todos. O homem contou que estava sentado à beira do riacho, pescando, quando a donzela se aproximou e pediu um beijo. Ele deu o beijo. Depois a donzela tirara a roupa e pedira que ele a possuísse, pois queria saber o que era o amor. Mas como ele era um homem honrado, ele resistira, e dissera que a donzela devia ter paciência, pois conheceria o amor do marido no seu leito de núpcias. Então a donzela lhe oferecera o anel, dizendo: “Já que meus encantos não o seduzem, este anel comprará o seu amor.” E ele sucumbira, pois era pobre, e a necessidade é o algoz da honra. Todos se viraram contra a donzela e gritaram: “Rameira! Impura! Diaba!” e exigiram seu sacrifício. E o próprio pai da donzela passou a forca para o seu pescoço. Antes de morrer, a donzela disse para o pescador: - A sua mentira era maior que a minha. Eles mataram pela minha mentira, e vão matar pela sua. Onde está, afinal, a verdade? O pescador deu de ombros e disse: - A verdade é que eu achei este anel na barriga de um peixe. Mas quem acreditaria nisso? O pessoal quer violência e sexo, não histórias de pescador. E não é a mais pura verdade que o sexo e a violência tem imperado com mais frequência que a verdade na vida contidiana. Os programas de tevê fazem questão de serem o mais sanguinários possíveis e a medida que é mais sanguinário mais audiência conquistam, ainda que a realidade não seja tão drástica assim, as vezes.

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