domingo, 21 de março de 2010

A vida complexa dos azulejos

Sentado no canto inóspito e hermético de um quarto vazio e sombrio, enquanto subtraia das sombras os raios mais fulgidos, perguntava ao azulejos encardidos se era isso o que eles queriam ser. Ante a ausência de resposta, entendia-se que eles eram indiferentes à natureza de sua existência. Eles faziam, e apenas faziam, o que tinham sido programados pra fazer. Era tão estranho ver que eles não podiam ser mais nada, que não tentavam ser mais nada. Como se entregavam àquela natureza obscura e trágica da qual lhes haviam dito ser suas. Os azulejos se conformaram com a vida que tinham. Talvez não tenha sido sempre assim, talvez, e apenas talvez, já tenham tido vontade de lutar para serem outras coisas, todavia hoje eram só azulejos encardidos. E pareciam não se importar, por que só essa natureza, forçada e morta, lhes fazia sentir como que confortáveis. E ele, que não sabia quem era, se perguntava por que ser azulejo era tão difícil, tão complicado. Ele percebeu que os azulejos não respondem. Eles apenas mostram o que são, e os outros que copiem, caso queiram, sua esquadria.

Um comentário:

  1. Pô, muito bom mesmo esse texto! Ainda bem que não nem todos somos como os azulejos encardidos, não? Ainda bem que alguns podem escolher ser azulejos limpos, ou ser vitrais. Uma pena é que muitos são exatamente como estes azulejos encardidos: são o que são, e desconhecem que podem mudar.

    ResponderExcluir